terça-feira, 4 de junho de 2019
Os Maus Costumes que a Gente Carrega / Fábio de Carvalho Maranhão
Para falar sobre maus costumes é
preciso antes de tudo se despir, a princípio, da venda que carregamos por
vaidade ou da mania de querer ser superior, impoluto e cristão purificado, mas
por consciência, dos três juntos.
*
Maus costumes, pensamos, só prejudicam
a nós mesmos, mas de modo particular, quando paramos para refletir, sabemos,
vemos e sentimos que seus efeitos ultrapassam os efeitos monossilábicos do
ponto de vista da individualidade ou como também chamamos, da vida particular. Eu
falo isso por ter refletido e analisado muitos maus costumes meus para poder
chegar a observar e refletir acerca de maus costumes alheios, e porque não
dizer, também, coletivos, do ponto de vista da cultura que influencia
comunidades inteiras. Um exemplo lamentável é a cegueira que adquirimos por
conta do fanatismo político. Muitas vezes, e eu arrisco dizer, que é um costume
aprendido dentro de casa, sem a prática da reflexão nem o conhecimento da
história como manda o figurino. A política gera analfabetos de toda natureza,
em especial esse deficiente visual que chamamos de ignorante, essa canalha que
chamamos de vadios das praças públicas e de beiras de esquinas, que “não perdem
tempo” para ler um capítulo de um livro em algum momento do dia ou da noite. Os
vadios das praças públicas aumentam em dez vezes, no mínimo, qualquer tipo de
notícia que possa trazer à tona alguma polêmica relacionada à politicagem. Vivem
de falatórios, apontam os dedos sujos para quem não levanta a bandeira que
defendem, riem alienados de tudo que possa representar um ponto a menos para
seu “adversário nas urnas”. Isso é muito perigoso pelo fato dessas práticas serem
estendidas para seus lares, onde crianças escutam, presenciam e acabam
aprendendo esses maus costumes que beiram o terreno do fanatismo e da
ignorância política somada à preguiça para estudar, para que aprendendo,
reflitam e sejam encorajadas por si próprias a agir diferente quando os maus
costumes foram cargos chefes do ponto de vista das tradições familiares ou até
mesmo culturais da sua comunidade. Se meu pai estivesse entre nós nos diria
assim:
*
___
Mau costume se tira com trabalho, levantando cedo e estudando. Quando a gente aprende
quanto é o papel de energia à gente apaga a luz do banheiro, não esquece o
ventilador ligado e aprende a tomar banho frio. Mas isso é culpa de muitos pais
e mães que desde cedo mostram ao menino que tem hora que é melhor dormir tarde,
acordar tarde, “aproveitar a mocidade” por que o tempo passa, e que é melhor “viver
a vida”.
*
Eu aprendi com papai a ser uma pessoa
responsável, incapaz de deixar de honrar meus compromissos, pronto para fazer o
que for preciso para afirmar e reafirmar com ações que meus sobrenomes Carvalho
e Maranhão merecem respeito. Lembro que quando a antiga prefeitura Palácio
Executivo Municipal José Valença Borba era na Rua Coronel José Belarmino, meu
pai ia receber lá, geralmente no turno da tarde. Nessa época o prefeito de
Cortês era o senhor Manoel José da Silva, uma figura emotiva e do ponto de
vista político, popular. Pois bem! Nessa época, papai já saia com o papel da
água e da energia no bolso. Quando chegava em casa, os colocava em caixas de
forma organizada. Havia um armário verde no quintal de lá de casa, situada a Rua
Padre Antônio Borges, número 43, ao lado da quadra esportiva Hilton Alves
Cavalcante Filho. O tal armário era cheio de ferramentas de papai. Na prateleira
de cima, havia documentos de toda a espécie organizado, que geralmente, se
resumiam em contas pagas. Entre uma ação e outra do meu pai, eu aprendia com
ele, muitas vezes, sem ele pronunciar uma palavra. __ “Aprendeu como se faz,
Fabinho?”, referindo-se a uma tilápia, peixe de água doce conhecido por Chilapo
ou Chilapão após tirar as escamas e trata-lo. Essa foi uma das poucas vezes que
ele me perguntou se eu havia aprendido a fazer algo que ele acabara de fazer. Nessa
ocasião, ele me pediu para levar o sal até ele, mas a real intenção de papai
era me ensinar a tratar peixes. Da mesma maneira foi com a carne de boi, de
porco, de bode e galinha. Eu sempre descascava o alho, cortava verduras e pegava
os temperos que ele utilizava. Aprendi muita coisa observando meu pai na
cozinha da nossa casa. Mas voltando aos maus costumes, para concluir essa prosa,
eu creio que muita gente carrega consigo maus costumes, sem dúvida, por não ter
tido um pai como o meu. Seu maior ensinamento foi quando certa vez, me contando
umas histórias que seu avô lhe contava, ele me disse:
*
“Nunca se arrependa de ser honesto!”.
(Carlos Alberto de Albuquerque Maranhão)
*
Fábio de Carvalho Maranhão
Cortês-Pernambuco, segunda-feira, 03 de junho de 2019 (09h36min – 10hs13min)
– (Agrovila Barra de Jangada)
*
Autofotografia: Janeiro/2019 |
domingo, 2 de junho de 2019
Falsidade Escancarada é o Combustível de quem Veste a Roupa de Coxinha / Fábio de Carvalho Maranhão
*
É isso se vê da forma mais explicita em cidade de interiorzinho, onde o
povo todo se conhece, onde ainda existe parede de meia, onde se toma pinga em
bodega ou em barracão, onde se conhece a pessoa pelo bisavô, avó, pai, enfim,
onde por causa dos contatos serem mais frequentes e corpóreos, algumas pessoas
se acham no direito de usar de má fé, muitas vezes, pelo fato de serem tratados
bem, com educação, abrindo brecha para levar uma facada de todo tamanho. É que
existem pessoas que confundem as coisas, e a classe mais acostumada a fazer
isso é a classe dos políticos. Chegamos a ver logo após um cumprimento simples,
um “vai tomar banho...” e ainda a mãe é quem paga por tabela em complemento. É
por isso que me refiro à falsidade escancarada.
*
Vemos no interior toda espécie de
mazela quando o assunto é falsidade. Político falando mal do outro em frente ou
dentro da Câmara de Vereadores, onde algumas vezes, o atingido quando chega, só
não sai mesmo casamento, pois é tanta cena fajuta de teatro, tanto “pra quê isso”
que não sei como eles não vomitam um em cima do outro. Se bem que em outros
tempos, quando dona Corina era viva, vi uma cena que ela certamente não me
deixaria mentir.
*
Estávamos próximos ao centro da Cidade
de Cortês. Dona Maria da Lanchonete já estava com o ponto organizado e servindo
refeições diariamente além de lanches, que era de rotina. Perto da gente passou
um vereador de mandato, cheio de si e com certeza, nunca havia lido um livro ou
até mesmo um artigo sobre qualquer livro que se possa imaginar. Parecia
furioso, e como quem distraído e ao mesmo tempo alerta, falou em voz alta,
dando a entender o que ele desabafava. As palavras do tal vereador foram
“Aquela desgraça me paga”. Entre um detalhe e outro, juntamos o quebra-cabeça e
chegamos ao ponto-chave do assunto. O vereador era da mesma bancada que a dele,
além de conviverem bastante, dialogando amigavelmente, votando até combinado em
qualquer projeto que fosse encaminhado para a Câmara. Nós não entendíamos o que
se passava, mas com certeza, o problema era resolver o problema dele. “O mundo
que se exploda” falou ele com um ar de incrédulo ou blasfemador e emendou:
“Quero resolver meu problema”...
*
O foco, geralmente de todas essas
pessoas antenadas às tendências de tudo do século XXI, é si próprio. Outras,
sem perceberem, acabam sendo influenciadas por uma ou duas situações:
vagabundagem e música sem conteúdo cultural algum. É a partir daí que surge
falsidade de todas as espécies. Não é generalizando, mas quando um amigo se
sente superior ao outro ou quando sente inveja daquela pessoa que mais agiu com
lealdade com ele, pode-se dizer que o mundo está de pernas para o ar mesmo. Mas
voltando ao assunto falsidade, tenho visto cenas de embrulhar meu estômago.
*
Outro dia quando larguei da escola, vi
perto da rua em que moro, três professoras conversando, já que parei para falar
com um amigo na lanchonete de Dona Maria, onde por sinal, tomei um café hoje
por volta de onze e meia da manhã. O diálogo entre elas foi sigiloso, até mesmo
pelo volume da fala, mas não deu para escapar uma cena quando terminaram a
conversa. Uma das professoras, a que estava de saída, foi repreendida após um
monte de beijos e abraços, com uma língua direcionada a ela por aquela que mais
foi carinhosa com ela. Quem morreu de vergonha foi eu, pois eu já havia pago o
café e estava de saída, entre o chão da lanchonete e o chão da calçada. A
professora não teve reação e seguiu em frente. A infeliz que lhe deu língua
ficou toda por fora e provou uma das coisas que a falsidade obriga a provar quem
vestir sua roupa: vergonha, vexame, mau bocado, enfim, como queiram chamar,
como melhor se fizer entender.
*
Na porta da delegacia, após uma
confusão no trânsito, encostou um eterno aspirante a candidato a vereador e
tentando resolver o problema antes que a polícia chegasse, falava no pé do
ouvido de um algo do tipo:
*
___ Será resolvido da melhor maneira, meu amigo!
*
Ele falava assim
em tom que todos que estavam observando a confusão pudessem ouvir. Mas em
surdina, dizia para um deles, o que ele se dirigiu a pouco:
*
___ Não abra não! Ele tem dinheiro para mandar concertar o estrago que
fez no seu carro.
*
Em meio tempo, ele
já corria em direção fazendo jeito de bravo, para o outro imaginar que
realmente ele estava defendendo seus interesses, mas já aliviava o discurso,
colocando uma das mãos no ombro sujeito dizendo:
*
___ Dá um toco ao delegado, Zé Mané, que ele te libera. Deixa esse
lascado pra lá.
*
Essas histórias de
interior que narrei acima não são nem um paliativo para o que tenho visto,
escutado e ouvido falar. Uma das cenas que mais me chocou foi quando certo dia,
duas autoridades religiosas do município encontraram-se em um evento público,
na conhecida Praça da Bíblia, apelidada vulgarmente como Praça da Mentira. Não posso
dizer que o acontecimento foi irreal, pois esse eu presenciei a poucos metros
de onde eu estava. Não posso detalhar o acontecimento por não querer expor
situações que possam desgastar alguma simpatia que ambos tem por mim, mas em
resumo, posso dizer que levantam a mesma bandeira e guerreiam entre si Nunca vi
uma coisa dessa na minha vida! Ou melhor, eu já até vi, porém, em pleno século
XXI, época em que as igrejas rogam tanto por paz, presenciamos situações que
descaracterizam tudo aquilo que se chama cristianismo. Outro dia mesmo um jovem
saiu eufórico da escola gritando que era a favor da pena de morte, sendo que
naquele mesmo dia, um padre e um pastor ministraram palestras para os alunos,
onde uma das temáticas mais abordadas foram questões sobre “ser cristão” e
sobre “o desarmamento”. A palestra do Padre foi às oito horas da manhã. A do
Pastor que não me recordo qual a ideologia protestante ele defendia, ocorreu à
tarde. Fizeram uma proposta de uma palestra conjunta, conde os estudantes
pudessem ver um exemplo ecumênico, a fim de incentivar a Tolerância Religiosa,
mas houve reprovação por parte de um deles. Por que terá sido?
Enquanto o tempo
vai passando, vemos situações de arrepiar quando o assunto é falsidade. Vamos
aos exemplos?
*
___ Só bebe cachaça porque eu pago!
*
Quando o amigo chega só não lhe coloca
no colo.
*
___ Beba o que quiser. Hoje quem paga sou eu! Você não é tomador de
cana? Pois bem, eu sou o pagador. Venha, entre, sente! Vai tomar o que?...
*
Muitas vezes,
quando o amigo saía embriagado, pois ele empurrava cachaça nele com força, ele
emendava:
___ Vai embora logo!! Estavas sem beber a dez anos, foi cachaceiro? Se
ele demorasse mais um pouco iria deixar o bar sem pinga.
*
Esses tipos de comportamentos em cidade
de interior são comuns. É lamentável saber que existem pessoas com tanta
falsidade. É por isso que eu sempre falo que falsidade escancarada é o
combustível de quem veste a roupa de coxinha.
Confesso a todas e a todos: “A palavra
“falsidade” tem muito me ajudado a refletir sobre a importância da
verdade. Vamos pensar mais nisso?”.
*
Fábio de Carvalho Maranhão
Cortês-Pernambuco, Domingo, 02 de junho de 2019 (13h43min – 14hs53min) –
Biblioteca Particular / Escritório de Trabalho.
Autofotografia(abril/2019): Fábio de Carvalho Maranhão Arte disposta: Analiel Francisco |
sábado, 1 de junho de 2019
Aparta-se da Aparência das Vigaristas / Fábio de Carvalho Maranhão
Crônica de Hoje
...escrevendo...
OBS.: +18
sexta-feira, 31 de maio de 2019
Educação Para Poucos e Migalhas Para Muitos: Nação Ignorante Se Alimentando de Restos / Fábio de Carvalho Maranhão
Em Revisão
31 de Maio de 2019
A Natureza Morta e Chico Mendes no Porta-Retrado da Minha Biblioteca / Fábio de Carvalho Maranhão
Em Revisão
31 de maio de 2019
Justiça Para o Senhor José, Para o Filho do Rei o Ministério da Justiça / Fábio de Carvalho Maranhão
Em Revisão
31 de maio de 2019
Eu Me Pergunto Se Estou Certo e A Resposta Me Vem à Tona / Fábio de Carvalho Maranhão
Em Revisão
31 de maio de 2019
O Clamor de Quem Precisa é O Passaporte para o Inferno Para Quem Faz o Povo Clamar / Fábio de Carvalho Maranhão
Em Revisão
31 de maio de 2019
Lástima de Pobre é Música aos Ouvidos da Gentalha / Fábio de Carvalho Maranhão
Em Revisão
31 de maio de 2019
quinta-feira, 30 de maio de 2019
Remédio bom é Remédio Caseiro / Fábio de Carvalho Maranhão
Eu passei boa parte da minha vida
ouvindo minha Mãe e minha Tia dizendo: “Laranja
serve para empachamento”, “É bom comer pelo menos um pedaço da casca da manga
que você chupar”, “Lambedor bom é o de
abacaxi”, “Bom mesmo para o fígado é não abusar de óleo, comida velha ou
cachaça”, “Quando der azia, chupa limão”, “Soluço se cura com susto”...
*
Não é de impressionar, pois esses
ensinamentos muita gente tem aprendido de geração em geração, e é dessa forma,
se redesenha a cresça, a cultura e até a esperança de outros tempos. Vale dizer,
que testei cada ensinamento citado acima, e logo pude perceber que escutar os mais velhos é o mesmo que evitar
uma guerra ou uma simples indisposição gerada por excessos ou descuidos. Naturalmente,
quando se é bem jovem, tudo que nos ensinam vira uma espécie de referência para
nós, que em algum momento usaremos na vida prática. Outro dia mesmo, curei o
soluço de uma aluna na escola onde trabalho há quase nove anos. A escola Santo
Antônio, situada na Zona Rural da Cidade de Cortês, numa Agrovila chamada de
Barra de Jangada, terra onde o senhor Severino Rodrigues de Moura residiu por
muito tempo, deixando um legado exemplos diversos para quem conhece sua
história. Foi seu Moura quem me lançou oficialmente poeta, a pedido de Papai,
quando em uma conversa com meu velho, tomando uma cerveja expressei minha
vontade de lançar um livro de poesia, e sabendo que seu Severino tinha muito
apreço a papai através de Tia Irene, lhe perguntei se ele não poderia falar com
ele para me indicar a uma editora, já que naquele tempo, meu conhecimento sobre
os caminhos editoriais eram tão rasos quanto o acesso à internet. O tempo passou
e papai me levou em Caruarú, em casa do escritor amigo, onde fomos recebidos
com muita educação. Lembro que onde seu Moura residia, mesmo em frente à sua
casa havia um edifício, se a memória não me falha, chamado Edifício Machado de
Assis. Arrepiei-me quando vi, pois àquelas alturas eu já lia o escritor de Dom
Casmurro, Helena, Ressurreição, Memórias Póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba,
A Mão e a Luva, Crisálidas, Falenas e Americanas, Relíquias de Casa Velha entre
tantos outros. Eu devorei por inteiro a obra de Machado, e não falo isso com
vaidade, mas com orgulho, pois se não fossem essas leituras, eu jamais seria o
que sou hoje no campo acadêmico e literário. Até já registrei que o amigo
Luizinho foi quem me presenteou com o clássico machadiano, que lançou para nós
o desafio de buscar conclusões a respeito da suposta traição de Capitú, cuja
personagem, acompanhada de Bentinho, Escobar e Sancha compuseram uma grandiosa
página da história da literatura brasileira. Eu entendi aquilo como um sinal
superior. Justamente “Machado de Assis”, o edifício?!...
*
Conversamos cerca de quase quarenta
minutos na área externa de visita da casa de seu Moura, e para resumir, essa
visita me rendeu uma nota biográfica curta e duas poesias no livro sobre
Cortês, intitulado “Cortês, Cidade do Rio e das Serras”, que seu Moura lançara
no Salão Nobre da Prefeitura Municipal de Cortês José Valença Borba no ano
2002. Lembro como se fosse hoje: 500 exemplares sobre uma mesa, onde a sua
maioria estava autografado para ser entregue após o final do lançamento. A parte
lamentável foi que em um dado momento, em parte de um discurso, um ex-prefeito
de Cortês fora ofendido, onde não sei se a infelicidade discursiva fora por
conta do calor do momento, com objetivo de agradar a outras partes, mas com
referências que expuseram a vida pessoal do senhor Eronides Campos, um vereador
na época e também irmão do ex-prefeito, levanta-se de maneira clássica, em
seguida, cumprimenta algumas pessoas que compunham a mesa e retira educadamente.
As pessoas que estavam lá, sabem quem proferiu o discurso, e sem alongar muito
essa conversa, registro que lamento profundamente a atitude, porém, sem levar
isso comigo como algo que pareça raiva ou tentativa de desconsiderar ninguém.
Se fosse comigo, eu faria como falou Chico Xavier quando ele nos disse através
do seu guia espiritual “Deixa um sinal de
alegria por onde passa”.
*
Mas retornando aos remédios caseiros,
lembro muito bem quando em um período junino, ralamos milho seco para fazer cuscuz
sangue puro, tia Irene e eu, fizemos pamonha, canjica, bolo de milho e milho
cozinhado. Se houve mais alguma coisa não me recordo. O café não podia faltar.
Minha tia não arriava duas garrafas cheias em cima da mesa amarela de quatro
cadeiras que havia no começo da cozinha. Dona Ídes, dona Maria da Água se
fossem vivas, não me deixariam mentir. Mas tem muita gente ainda que acompanhou
essa história e que sentou naquelas cadeiras para tomar café conosco e falar
desde as viagens ao Juazeiro até os remédios caseiros. Mas esse dia ficou
marcado por causa da prosa que tivemos sobre essas plantas, que no linguajar de
tia Irene, eram matos.
*
___
Sabe para que serve pião roxo?
___
Não, titia...
___
Serve para muita coisa, uma das coisas é para proteger a casa, os pés de
frutas, até a gente mesmo. Os índios são sabidos nesse assunto.
___
Os índios?
___
Os índios conhecem todo tipo de mato e para que cada um serve. Mas o mais
importante não é só conhecer e saber para que cada um serve, é bom saber fazer
os remédios.
___
É difícil, titia?
___
O tempo ensina, Fábio...
*
Após cada dedo de prosa, eu aprendia
mais uma coisa com tia Irene. Ela como era de idade sabia muito bem o que
estava dizendo. Eu, bem jovem, acreditando e tomando nota mental de tudo, tive
a oportunidade de ampliar meu conhecimento acerca de muita coisa que muita
gente hoje, na minha idade, não sabe... Mas o mais interessante de tudo isso, é
que uma coisa ficou na minha mente, e que eu faço questão de registrar para
que, quem tomar conhecimento, faça uma reflexão, e que essa reflexão seja
válida à sua vida prática.
Tia Irene me contou uma história. A
história se passou a pelo menos, contando da data em que ela me havia contado,
uns cinquenta e seis ou cinquenta e oito anos. Aconteceu no engenho Cruz, onde
meu bisavô Guilherme Felipe Teixeira e minha bisavó Lídia Teixeira de Carvalho criaram
dentre seus filhos, Irene, Rogaciano, Julivaldo e Felisberto, meu avó, pai da
minha mãe, além de Eládio, que falecera aos cinco anos de idade e mais quase
vinte filhos adotivos entre sobrinhos, afilhados e outros que não tiveram a
bênção de serem criados pelo pai e pela e pela mãe. Tia Irene, sendo a mais
velha, ajudou a criar todos e deu continuidade a prática angelical, cuja
sentença maior, foi lhe dada por Deus, em viver uma vida de caridade. Terminou
seu feito, comigo sendo o último sobrinho que ajudou a criar e a educar, na
casa em que hoje resido, na avenida São Francisco, em Cortês-PE, parte do chão
da minha infância e juventude, pois a outra parte é na rua Padre Antônio
Borges, onde meu papai e minha mãe construíram o lar da nossa convivência e
construção das nossas vidas. Mas voltando a história, - e que história!! -, vou
encher uma xícara de café para tomar fôlego e escrever pela primeira vez uma
narrativa sobre essa prosa, que tanto me ensinou quanto me fez enxergar algumas
coisas além, coisas essas que só passamos a perceber ou a compreender ou quando
a experiência nos pesa os ombros ou quando alguém nos abre os olhos e escreve
em nossas vidas uma parte da sua história ao dividir suas próprias experiências...
*
Antes do meio dia de um dia de meio de
semana, estavam todos sentados à mesa para almoçarem. Tanto minha vó quanto
minha tia tinham muitos afilhados e afilhadas, e como era de costume, talvez
uma questão cultural da época, as casas dos padrinhos sempre recebiam visitas
dos afilhados e afilhadas constantemente, fato que hoje é muito diferente, até
porque as relações humanas tem sido modificadas por muitos motivos, entre eles,
como diria um sambista carioca, uma constante crise da consideração. Até mesmo
a famosa profecia da gentileza não é posta em prática. O profeta se foi, deixou
a mensagem, porém, a coisa anda muito diferente do que deveria ser. Aquele dia
ficou marcado para minha tia, pois lhe levaram um dos seus afilhados, no
engenho, em pleno meio dia, justamente antes de todos terminarem o almoço, ela
com seu jeito, só sentava para almoçar quando todos já estavam sentados e
servidos. Demorou mais do que o habitual, e como se pressentisse algo, não
havia chegado fome àquelas alturas. A história se inicia quando falou sobre
esse afilhado que segundo ela e todos que residiam no Cruz e nas redondezas,
dava muito trabalho ao seu pai, o senhor Jacobino, conhecido por seu Jacó e seu
Bino, cortador de cana e tirador de conta, e dona Higina, conhecida pela
maioria por dona Galega. Ele, um afrodescendente trabalhador, ela uma galega,
descendente de portugueses, escrava do rio onde lavava roupas e as louças e do
fogão de lenha. Falavam que ela gostava de se divertir na calada, até falaram
que o filho Juvenal Higino não era filho de seu Jacó. Mas isso já é outra
história, e a história que Tia Irene me contou é curta, mas deixa uma lição para
a vida. Ela começou a história me dizendo que...
*
___
Naquele tempo, sabe como era que as pessoas resolviam problemas com quem andava
fazendo mal feitos?
*
Dei com os ombros para cima.
*
___
Pois é. O menino de comadre Higina era buliçoso. Gostava de mexer no que era
dos outros. Não faltava corrigenda de compadre Jacó. Outro dia mesmo ele veio
aqui conversar com pai para pai dá conselhos a ele. Ele só respeitava pai, mãe
e eu. O resto para ele era coisa qualquer. Não sei porque Juvenal aprontava
tanto. Não podia ver uma galinha. Gorda ou magra ele passava a mão. Não sei
quem ensinou àquele menino a fazer cabidela. Uma vez ele trouxe uma porção para
pai e mãe numa panelinha de barro, já para mim foi numa panela de alumínio, sem
o sangue, pois ele sabia que eu não gostava de molho pardo, e lembrando isso,
quis agradar a sua madrinha. Dias depois só ouvimos os gritos no terreiro: “Ladrão de galinha!”, “Pega o ladrão de
galinha!”... Naquela hora que me arrepiei e lembrei-me da galinha guisada e
da cabidela. Fui me confessar no outro dia. Não dormi àquela noite.
*
O menino Julião era mão leve. E como
naquele tempo se resolvia ou considerando o pai e a mãe de quem praticava essas
coisas ou o buraco era mais embaixo. A confusão foi grande...
*
___
Não se pode mexer nas coisas dos outros, Fábio! Não esqueça disso!
___
Eu sei, tia! Não vou esquecer isso não.
*
O desfeche da história foi lamentável.
Passados quase três meses da saída do senhor Jacobino e de dona Higina, Julião
ficou perambulando no Cruz, chegando para visitar meu bisavô e minha bisavó
sempre nas horas das refeições, depois sumia e só chegava no horário da
refeição seguinte. Dormia na choupana que fora dos seus pais, mas todo o resto
era na casa da minha família. Casa com 18 janelões, três salas, duas cozinhas,
8 quartos, alpendre, área de fundos... Era uma verdadeira mansão. Meu avô tinha
um barracão, e vendia com frequência a toda aquela gente que chegando com ou
sem dinheiro, levavam a mercadoria. Meu bisa Guilherme nunca negava uma venda a
seu ninguém e ninguém lhe passava caranha. Outro dia eu ouvi em surdina, que um
homem que devia um valor lá na venda, após ter desencarnado, apareceu com uma
moeda na mão direita para pagar a dívida. Não sei como se deu se deu o desfeche
dessa conversa, pois quando tia Irene conversou isso com minha mãe eu era muito
pequeno, por isso só me lembro desse detalhe. Mas entre as idas e os sumiços
aquele foi o ultimo dia em que ele visitou o chalé do Engenho Cruz...
*
___
De tanto mexer no que era dos outros, chegou lá em casa, no engenho, na frente
do alpendre principal, dentro de um saco enorme, uma espécie de matulão, só que
daqueles que aparece na música de Luiz Gonzaga, onde cabe tudo dentro dele. Mas
o pior não foi isso. Julião chegou sendo arrastado dentro de um saco através de
um cavalo. A cena foi horrível. Mãe chorou feito uma desesperada. Pai ficou ao
pé do Alpendre, no lado direito. Coçou mais a cabeça do que se tivesse piolho
ou pulga-de-bicho. Ninguém contestou nada. O sujeito que o arrastou nada tinha
que ver com isso. Ele apenas mirou nos olhos dos olhos de Pai e disse as
seguintes palavras.
___
Não foi falta de aviso, não foi seu Guilherme?
*
Foi-se cedo. Não deu tempo sequer ver
um filho nascer ou algo mais. Meu avô, como quem não pensasse para falar, disse
apenas que quando uma andorinha se separa das outras, é sinal positivo e
negativo. Lembro que uma vez Tia Irene me explicou melhor isso que chamo de
aforismo.
*
___
O que ele quis dizer, Tia Irene?
___
Disse que o caminho está aí, e que só nós podemos escolher a direção que quer
caminhar. Só há dois caminhos. O primeiro é o da escolha. O segundo, também o
da escolha... Ou vai por aqui ou vai por ali...
*
Recebi
aquelas palavras como mais um conselho da minha Tia. Palavras serenas, que
falavam de escolhas, maturidade, caminhos. Eu pude entender a preocupação da
minha Tia em querer me contar essa história. Triste história que acabou tão
cedo e que poderia ter tomado outro rumo, mas como nem todos escolhem o melhor
caminho...
*
Lembro-me que terminamos a conversa falando
dos melhores remédios para sinusite além de alguns procedimentos, como limpeza
nasal, inalação, chá de eucalipto, entre tantas outras podem ajudar a diminuir
os efeitos de uma crise.
*
___
Estais vendo esse suco de espinafre?
___
Estou vendo, Tia!
___
Vamos tomá-lo, que é bom para fazer a digestão, serve para inflamações, ajuda a
manter e a saúde dos ossos.
___
Vamos sim, Tia.
___
Está vendo aquele mato ali?...
*
Fábio de Carvalho Maranhão
Cortês-Pernambuco, quinta-feira, 30 de maio de 2019 (00h05min – 01hs13min)
– Biblioteca Particular / Escritório de Trabalho.
*quarta-feira, 29 de maio de 2019
O Artista Vai Onde o Povo Está! Depois a Gente Conta Nossa História... / Fábio de Carvalho Maranhão
Enquanto muita gente pensa que para caminhar nas estradas das artes
basta carregar consigo um violão, se encher de vaidade, escrever um ou dois
versos com rimas, cadência, oração e sequência para impressionar quem ler ou
ouvir uma declamação, vestir-se ou de acordo com seu perfil, ocasião ou seu
espírito de artista. Existem tantas outras coisas possíveis de citar,mas
enquanto isso deixo a cargo do amigo leitor e da leitora amiga a
fluência da capacidade imaginativa.
*
Nós, artistas, pisamos em um chão
áspero, que por sinal, muitas vezes, maltrata e gera desânimo. Já conheci,
convivi, conversei, tomei conhecimento de muitos que deixaram a labuta
artística por pisar em pedras pontiagudas e espinhos violentos. Outro dia,
quando fui a Palmares cumprir uma Agenda Cultural na FAMASUL, faculdade que
realizei graduação e pós em Ensino de História, enquanto eu organizava o
material, escutei uma rápida conversa entre dois colegas presentes, onde um
afirmou que alguém que ele conhecia só abandonou o chão da música por não
carregar alma pura de artista. Não pude interferir na conversa por não achar
conveniente e por saber que cada caso nos remete a uma história de vida
diferente, porém, na minha cabeça passou um filme de suspense, aja vista, tenho
desanimado bastante quando o assunto é continuar tocando o barco da música com
o mesmo orgulho de quando comecei a trabalhar com esta arte profissionalmente.
Lembro que um falou da seguinte maneira:
*
___ ...parou porque não é um artista de sangue puro!
___ Falando assim, mais parece com o discurso infame do nazista...
___ Falo sério! Era para ele ter continuado, pois o cara toca
um violão condenado...
*
Confesso que ao
ouvir aquela conversa, o coração acelerou. Para estar em Palmares levando
comigo minha poesia, minha música e canções de artistas que escreveram com sua
arte não apenas a história da música brasileira, mas também a história do nosso
país, deixando um legado de engajamento social e de vergonha na cara, eu cumpri
uma jornada muito corrida e me esforcei bastante, para uma vez tendo cumprido
as obrigações até 17 horas daquela quarta-feira, eu pudesse escrever mais um
capítulo da minha história e participar da história dos pesquisadores,
acadêmicos, historiadores, estudantes do curso de Ensino de História presentes
naquele evento promovido pelo professor mestre, poeta, escritor e historiador
Vilmar Carvalho, acadêmico da casa. Eu, como artista do evento, ex-aluno já
havia registrado, recarreguei minhas baterias cerebrais a partir do momento em
que recebi aquele boa noite caloroso do meu ex-professor de economia política e
orientador do artigo científico que escrevi durante o pós-graduação, intitulado
de “História e Poesia na Sala de Aula: Inovando O Ensino De História Nos Anos
Finais Do Segundo Ciclo Do Ensino Fundamental”.
*
___ Boa noite, Poeta!
___ Satisfação revê-lo professor!
___ A satisfação é nossa!!!
*
Antes mesmo de
dialogarmos um pouco, emendei com uma ideia cuja menção fora uma forma de
agradecimento de maneira antecipada ao amigo e ex-professor, por ter me
convidado para tomar de conta da agenda cultural do evento de mesa redonda com
os professores mestres e doutores Alexandre Lima e Marlon Oliveira, ambos meus
ex-professores, e Jeferson Evânio, ex-colega do curso de especialização em
Ensino de História:
*
___ Sinto-me honrado pelo convite, pois Palmares, sendo um celeiro de
Artistas, o senhor me convidou para trazer minha poesia e minha música...
___ Além de ex-aluno, és um excelente poeta e músico, Fábio.
___ (...)
*
Entre uma conversa
e outra, os acadêmicos e participantes em geral foram chegando, se acomodando,
cumprimentando uns aos outros, enquanto eu, com o peso da jornada corrida que
percorri até aquela quarta-feira, fiquei imaginando o que é que um artista, um
poeta, um músico engajado, com responsabilidade social não faz para contribuir
de alguma maneira com algo que possa surtir efeito no pensamento e na
construção de ideias das pessoas. Aquele evento me deixou orgulhoso, pois além
de ser composto por sua quase totalidade de Historiadores, eu pude apresentar
um trabalho com um nível histórico e uma dinâmica estética muito importante.
Para se ter ideia, não é conveniente tocar na noite, em bares e churrascarias
algumas daquelas canções, como faço com frequência no aconchego do meu lar. Na
noite o repertório é diferente. Não se costuma encontrar nesses ambientes
pessoas que busquem nas metáforas das canções o êxtase da estética histórica
que mexa com seu intimo. Se bem que muita gente anda preocupada mesmo é com o próprio
umbigo ou com a vida privada das pessoas. É por isso que quando abri o evento
tocando Gonzaguinha, senti um arrepio ao perceber os olhares, o acompanhamento
labial de quem cantava junto, outros em silencio, meditando na letra, como se
estivessem paralisados. O professor Vilmar cantou de maneira recatada todas as
canções que apresentei. De Chico Buarque a Gonzaguinha; De Belchior a João
Bosco e Almir Blanc. Fazia tempo que eu não sentia um fluido tão positivo
quando se fala em apresentação musical. Quando dei conta, o tempo havia
passado, e como se o relógio não tivesse corrido, parecia que ainda haveria
mais uma ou duas horas para tocar o coração dos que ali sentados, trabalham no
dia a dia contribuindo para retirar a venda dos olhos de muitos e muitas que
são contaminados pelo teatro midiático que veste nosso país que chora e que
rir, que rir e que chora...
São nessas horas
que fazemos várias reflexões como artistas, poetas, compositores, músicos entre
tantos outros... Fazemo-nos perguntas, indagamos a nós mesmos se vale à pena
está no chão da estrada, levando para as pessoas nosso recado, nossa imagem,
nosso discurso, aquilo que acreditamos ser importantes para todas e todos nós.
Eu disse para mim mesmo, em surdina de pensamento:
*
___ Se der tempo eu faço uma boquinha lá na cantina...
*
É que com tanto corre-corre acabei não
jantando, e como o ônibus que leva os universitários sai às 18 horas em ponto,
eu tive que me apressar um pouco mais. Não cumpri o cardápio como de costume.
Mas aquele meu pensamento era negativo.
Durante a viagem de volta, tive a sorte
de sentar a meio palmo de uma das cadeiras do ônibus, que por sinal estava
lotado. Duas amigas ao me verem com violão e uma bolsa de costas naquele
imprensado em pleno corredor, falaram para mim:
*
___ Fabinho, senta aqui...
*
Aquele gesto para
mim valeu tanto à pena, que me lembrei de pronto da minha tia Irene Carvalho,
quando me dizia “Deus ajeita os seus, quando a gente pensa que não vai
se aguentar nem em pé, ele manda alguém arrastar um tamborete pra gente sentar
e descansar pra tomar fôlego”. Era mesmo assim que ela me falava quando aos
goles de café com leita, altas horas, aqui na avenida São Francisco, em Cortês,
varávamos a madrugada. Eu não sei dizer quando vale um momento desses, uma
lembrança dessas, uma emoção tamanha. Eu acredito em Deus e nas palavras da
minha tia-madrinha e avó, pois tudo que ela me falava era com o coração, e isso
dava para ler não nos seus olhos, mas na sua expressão. Se ela falou que Deus arranjaria
alguém arrastar um tamborete quando nós não nos aguentássemos mais ficar em pé,
e eu sempre acreditei, o dia de tirar a prova real foi nesse dia, que por
sinal, foram duas pessoas amigas e jovens e promissoras. Karolayne e Michele
foram os anjos que minha tia tanto anunciou. É por essas e outras que sempre
falo: O artista vai onde o povo está! Depois a gente conta nossa história...
*
Já ia me
esquecendo: quando cheguei ainda escrevi uma crônica...
*
Fábio de Carvalho Maranhão
Cortês-Pernambuco, quarta-feira, 29 de maio de 2019 (23h05min – 23hs31min)
– Biblioteca Particular / Escritório de Trabalho.
*
Autofotografia Biblioteca Particular / Escritório de Trabalho Sábado, 13/Abril/2019. |
terça-feira, 28 de maio de 2019
Quem Fura Fila do Almoço não Deveria Ter Direito à Sobremesa / Fábio de Carvalho Maranhão
Enquanto as regras de etiqueta, boa
educação, bons costumes, cordialidade e vergonha na cara vão sendo esquecidos,
deixados para trás, caindo em desuso, escândalos do ponto de vista do
amundiçamento vão se proliferando no meio de todas as classes socioculturais.
Apesar de muitas vezes sabermos que determinada coisa não se deve praticar,
muita gente acaba caindo no erro ou na canalhice de querer se dá bem até em
fila pública de almoço. Como se não bastasse à falta de educação de muitos e
muitas, uma coisa que ignoram é a ética do ponto de vista da conduta e do
exemplo que, alguns profissionais, deveriam fazer uso, especificamente aqueles
e aquelas que se auto-declaram professores e educadores.
Quando Renato Russo e Ruben Alves
falaram sobre o espelho, muitos profissionais da educação confundiram as
metáforas, e ao invés de verem um mundo doente e de se acharem na condição de
exemplos, preferem adoecerem da doença da falta de educação e de oportunistas.
Paulo César Pinheiro e João Nogueira expressaram com excelência o que de fato
um espelho pode gerar em nossas vidas. Refletiram e registraram sobre seus espelhos
e, além disso, além deles para suas vidas, deixando claro suas maiores
influências a respeito do que marcou na sua infância e do que vale a pena levar
a diante, além, um legado familiar, para uma descendência digna de exemplo vindouro
e presente.
Quando as realidades vão se desenhando e
as pessoas vão se adaptando a situações cotidianas do chamado “jeito brasileiro”,
muita coisa tende a dá errado, especialmente quando há quem se exponha em
cometer violações de direitos básicos do ponto de vista da isonomia ou de por que não dizer da igualdade.
Outro dia, participando de evento educacional,
pude observar de maneira discreta situações que variaram desde situações
diversas e palavras relacionadas a comportamento, oportunismos, vulgarismo,
canalhice, caráter, desrespeito, violação, gula, desmoralização, exemplo,
dissimulação, entre outros.
O dia estava cansativo. Segundo dia de
estudos, produções, debates, palestras e naturalmente, quando nos dedicamos mais
a alguns afazeres, sentimos, talvez, mais fome e sentimos uma maior necessidade
de sentarmos à mesa um pouco mais cedo. Havia
muita gente no prédio público da Escola Leão da Ilha. Professores, gestores,
auxiliares, secretários, palestrantes, aspirantes a pessoas educadas e inteligentes,
gente com ar de professor e professora “só que não”, esfomeados, viciados em
furar fila e aqueles que observavam de longe toda uma indigestão de maus
costumes e lamentáveis controvérsias, ou seja, contradições éticas que
certamente são naturais para uma boa quantidade de “professoras” que ou furam
uma fila para almoçarem ou morrem de fome caso não cometam ao menos uma vez por dia
um ato que desqualifique a imagem do professor em geral.
Perto de mim, havia uma professora que,
discretamente, observava tudo, e de maneira sutil, reprovava o que via com um
leve balançar de cabeça, inclinada para baixo e com a mão no queixo e a outra
segurando o cotovelo para melhor se apoiar. Eu sorria com o coração não por achar
engraçado ou por me afirmar superior em educação familiar aos que estavam
presentes, mas por entender toda aquela situação e saber que existiam pessoas
ali que também tem um compromisso com sua imagem através da ideia do espelho de
Rubens Alves, já que a maioria presente, além de quebrarem o espelho,
utilizaram seus cacos para influenciarem outras que ali estavam a praticarem a
má educação e adicionarem mais uma à coleção de fura filas.
Passados os minutos, mais de trinta
profissionais da má educação passaram na frente dos que chegaram primeiro. Eu não
me incomodei, mas meu estômago embrulhou. Não tive escolha e pensei:
*
___
“Isso vai me render pelo menos uma crônica...”
*
Havia uma professora que não se
contentando em ter furado a fila na cara dura, chamava outras de uma maneira
tão escandalosa que chegou até a incomodar outra que a antecedia.
*
___
“Vem fulana, passa na minha frente, eu deixo...”
___
Mulher, tú és doida é? Vou não!
___
Por que, doida? Eu furei porque tú não pode furar também?...
*
Após a conversa, sem querer querendo,
acredito que por força do hábito, a professora se enfiou no meio das outras e caíram
numa risada tão sarcástica, mas tão sarcástica, que gotas de saliva da boca de
uma caíram em cheio no prato de comida de uma das suas comparsas. Depois disso
foi que foi risada. Até a prejudicada sorriu, gargalhou, ficou vermelha e
emendou com essa frase:
*
___
O que não mata engorda! Estais com gripe suína, mulher?
___
Eu mesmo não! Vira essa boca pra lá!!
___
Então sai na urina...
*
A situação era tão escandalosa que eu
cheguei a acreditar por fração de segundo que eu estava no meio daquele povo
que não pode ver comida, não por não ter o que comer, mas por antar com o
espírito da gula no couro e a falta de educação como um fanatismo religioso que
se pratica.
Logo mais retornaríamos para darmos
continuidade aos estudos, e como se não bastasse, além dessas práticas
lamentáveis, acharam por bem sujarem mesas escolares e corredores com copos descartáveis. Não bastando, pouco depois após almoçarem,
fizeram competição para verem quem arrotaria mais alto. Eu não acreditei no que
eu via discretamente. Dessa vez combinaram para se afastarem dos demais a fim de realizarem
a competição de maneira menos escandalosa. Chegaram a apostar o lanche da
tarde, que ao que tudo indicava, seria servido no momento de sair. Imaginem só,
eram sete senhoras e senhoritas, professoras, apostando comida, furando fila,
chamando palavrões e apostando arrotos. Olhei para a professora que também observava
tudo, e por coincidência estava almoçando perto de mim e perguntei:
*
___
Onde é que esse mundo vai parar?
*
Ela, sem ter muito que falar, deu de
ombros para cima e para baixo, e não faz igual à ganhadora do concurso de arrotos,
não falando com a boca cheia, não gargalhando e consequentemente não cuspindo
todos que estavam próximos a nós, como ocorreu na fila, só que sem a boca cheia,
não chamando palavrões, enfim, não disse uma palavra, mas disse tudo com seu
silencio, seu olhar e seus ombros. Quando olhei para a cadeira que a professora
havia arrastado para perto de si, percebi um exemplar de Moacir...
*
___
Já leu esse, professora?
___
Acabei de ler
___
Vamos trocar?
___
Qual o título desse?
___
“Poema Limpo: Eu, dentro de mim”.
___
É seu? Sim.
___
Está trocado!
*
“Rimos...”
Eu tenho o mesmo exemplar na minha
biblioteca. Mas como o momento foi propício, repassei meu livro e acabei
repassando o adquirido. Moacir Gadotti é exemplar, pensei em voz alta...
___
Sim...
___
Uma boniteza, não é?
___
Um sonho...
Fábio
de Carvalho Maranhão, Cortês-Pernambuco.
Terça-feira,
28 de maio de 2019 (21h49min – 22h49min) (Biblioteca Particular / Escritório de
Trabalho)
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