Enquanto muita gente pensa que para caminhar nas estradas das artes
basta carregar consigo um violão, se encher de vaidade, escrever um ou dois
versos com rimas, cadência, oração e sequência para impressionar quem ler ou
ouvir uma declamação, vestir-se ou de acordo com seu perfil, ocasião ou seu
espírito de artista. Existem tantas outras coisas possíveis de citar,mas
enquanto isso deixo a cargo do amigo leitor e da leitora amiga a
fluência da capacidade imaginativa.
*
Nós, artistas, pisamos em um chão
áspero, que por sinal, muitas vezes, maltrata e gera desânimo. Já conheci,
convivi, conversei, tomei conhecimento de muitos que deixaram a labuta
artística por pisar em pedras pontiagudas e espinhos violentos. Outro dia,
quando fui a Palmares cumprir uma Agenda Cultural na FAMASUL, faculdade que
realizei graduação e pós em Ensino de História, enquanto eu organizava o
material, escutei uma rápida conversa entre dois colegas presentes, onde um
afirmou que alguém que ele conhecia só abandonou o chão da música por não
carregar alma pura de artista. Não pude interferir na conversa por não achar
conveniente e por saber que cada caso nos remete a uma história de vida
diferente, porém, na minha cabeça passou um filme de suspense, aja vista, tenho
desanimado bastante quando o assunto é continuar tocando o barco da música com
o mesmo orgulho de quando comecei a trabalhar com esta arte profissionalmente.
Lembro que um falou da seguinte maneira:
*
___ ...parou porque não é um artista de sangue puro!
___ Falando assim, mais parece com o discurso infame do nazista...
___ Falo sério! Era para ele ter continuado, pois o cara toca
um violão condenado...
*
Confesso que ao
ouvir aquela conversa, o coração acelerou. Para estar em Palmares levando
comigo minha poesia, minha música e canções de artistas que escreveram com sua
arte não apenas a história da música brasileira, mas também a história do nosso
país, deixando um legado de engajamento social e de vergonha na cara, eu cumpri
uma jornada muito corrida e me esforcei bastante, para uma vez tendo cumprido
as obrigações até 17 horas daquela quarta-feira, eu pudesse escrever mais um
capítulo da minha história e participar da história dos pesquisadores,
acadêmicos, historiadores, estudantes do curso de Ensino de História presentes
naquele evento promovido pelo professor mestre, poeta, escritor e historiador
Vilmar Carvalho, acadêmico da casa. Eu, como artista do evento, ex-aluno já
havia registrado, recarreguei minhas baterias cerebrais a partir do momento em
que recebi aquele boa noite caloroso do meu ex-professor de economia política e
orientador do artigo científico que escrevi durante o pós-graduação, intitulado
de “História e Poesia na Sala de Aula: Inovando O Ensino De História Nos Anos
Finais Do Segundo Ciclo Do Ensino Fundamental”.
*
___ Boa noite, Poeta!
___ Satisfação revê-lo professor!
___ A satisfação é nossa!!!
*
Antes mesmo de
dialogarmos um pouco, emendei com uma ideia cuja menção fora uma forma de
agradecimento de maneira antecipada ao amigo e ex-professor, por ter me
convidado para tomar de conta da agenda cultural do evento de mesa redonda com
os professores mestres e doutores Alexandre Lima e Marlon Oliveira, ambos meus
ex-professores, e Jeferson Evânio, ex-colega do curso de especialização em
Ensino de História:
*
___ Sinto-me honrado pelo convite, pois Palmares, sendo um celeiro de
Artistas, o senhor me convidou para trazer minha poesia e minha música...
___ Além de ex-aluno, és um excelente poeta e músico, Fábio.
___ (...)
*
Entre uma conversa
e outra, os acadêmicos e participantes em geral foram chegando, se acomodando,
cumprimentando uns aos outros, enquanto eu, com o peso da jornada corrida que
percorri até aquela quarta-feira, fiquei imaginando o que é que um artista, um
poeta, um músico engajado, com responsabilidade social não faz para contribuir
de alguma maneira com algo que possa surtir efeito no pensamento e na
construção de ideias das pessoas. Aquele evento me deixou orgulhoso, pois além
de ser composto por sua quase totalidade de Historiadores, eu pude apresentar
um trabalho com um nível histórico e uma dinâmica estética muito importante.
Para se ter ideia, não é conveniente tocar na noite, em bares e churrascarias
algumas daquelas canções, como faço com frequência no aconchego do meu lar. Na
noite o repertório é diferente. Não se costuma encontrar nesses ambientes
pessoas que busquem nas metáforas das canções o êxtase da estética histórica
que mexa com seu intimo. Se bem que muita gente anda preocupada mesmo é com o próprio
umbigo ou com a vida privada das pessoas. É por isso que quando abri o evento
tocando Gonzaguinha, senti um arrepio ao perceber os olhares, o acompanhamento
labial de quem cantava junto, outros em silencio, meditando na letra, como se
estivessem paralisados. O professor Vilmar cantou de maneira recatada todas as
canções que apresentei. De Chico Buarque a Gonzaguinha; De Belchior a João
Bosco e Almir Blanc. Fazia tempo que eu não sentia um fluido tão positivo
quando se fala em apresentação musical. Quando dei conta, o tempo havia
passado, e como se o relógio não tivesse corrido, parecia que ainda haveria
mais uma ou duas horas para tocar o coração dos que ali sentados, trabalham no
dia a dia contribuindo para retirar a venda dos olhos de muitos e muitas que
são contaminados pelo teatro midiático que veste nosso país que chora e que
rir, que rir e que chora...
São nessas horas
que fazemos várias reflexões como artistas, poetas, compositores, músicos entre
tantos outros... Fazemo-nos perguntas, indagamos a nós mesmos se vale à pena
está no chão da estrada, levando para as pessoas nosso recado, nossa imagem,
nosso discurso, aquilo que acreditamos ser importantes para todas e todos nós.
Eu disse para mim mesmo, em surdina de pensamento:
*
___ Se der tempo eu faço uma boquinha lá na cantina...
*
É que com tanto corre-corre acabei não
jantando, e como o ônibus que leva os universitários sai às 18 horas em ponto,
eu tive que me apressar um pouco mais. Não cumpri o cardápio como de costume.
Mas aquele meu pensamento era negativo.
Durante a viagem de volta, tive a sorte
de sentar a meio palmo de uma das cadeiras do ônibus, que por sinal estava
lotado. Duas amigas ao me verem com violão e uma bolsa de costas naquele
imprensado em pleno corredor, falaram para mim:
*
___ Fabinho, senta aqui...
*
Aquele gesto para
mim valeu tanto à pena, que me lembrei de pronto da minha tia Irene Carvalho,
quando me dizia “Deus ajeita os seus, quando a gente pensa que não vai
se aguentar nem em pé, ele manda alguém arrastar um tamborete pra gente sentar
e descansar pra tomar fôlego”. Era mesmo assim que ela me falava quando aos
goles de café com leita, altas horas, aqui na avenida São Francisco, em Cortês,
varávamos a madrugada. Eu não sei dizer quando vale um momento desses, uma
lembrança dessas, uma emoção tamanha. Eu acredito em Deus e nas palavras da
minha tia-madrinha e avó, pois tudo que ela me falava era com o coração, e isso
dava para ler não nos seus olhos, mas na sua expressão. Se ela falou que Deus arranjaria
alguém arrastar um tamborete quando nós não nos aguentássemos mais ficar em pé,
e eu sempre acreditei, o dia de tirar a prova real foi nesse dia, que por
sinal, foram duas pessoas amigas e jovens e promissoras. Karolayne e Michele
foram os anjos que minha tia tanto anunciou. É por essas e outras que sempre
falo: O artista vai onde o povo está! Depois a gente conta nossa história...
*
Já ia me
esquecendo: quando cheguei ainda escrevi uma crônica...
*
Fábio de Carvalho Maranhão
Cortês-Pernambuco, quarta-feira, 29 de maio de 2019 (23h05min – 23hs31min)
– Biblioteca Particular / Escritório de Trabalho.
*
Autofotografia Biblioteca Particular / Escritório de Trabalho Sábado, 13/Abril/2019. |
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