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segunda-feira, 27 de maio de 2019

Hoje não é Ontem / Fábio de Carvalho Maranhão


A Rua Padre Antônio Borges e a Avenida São Francisco foram os redutos da minha infância e juventude. Em uma, a quadra de esporte Hilton Alves Cavalcanti Filho, na outra, A Praça Prefeito Eronides Campos. Se de um lado jogávamos bola em pleno meio dia, do outro brincávamos no balanço da praça e comíamos amêndoas. Papai morou na rua do Padre, conhecida como Rua Cachoeira do Trincão, em referência a uma parte do rio Serinhaem, que foi cortado pela cidade quando o Senhor José Valença Borba fora prefeito. A praça dos pés de amêndoas era conhecida como Praça da Parada Obrigatória, por causa de um Bar que construíram, onde logo após, foi transformado em sorveteria, se a memoria não me falha. Essa Praça teve a mão de vários prefeitos, dentre eles, ao que me consta, Manoel José, Salatiel Oliveira, Ernane Soares Borba. Atualmente abriga, se não me engano, vários pés de acácias, de um tipo diferente dos que mais vemos por aí. Quando vão podar, parece mais que as árvores vão morrer de tanta falta de noção no trato e no trabalho empregado. De frondosas passam para o estado de depenadas de uma hora para outra. O sol invade o espaço público, e no mínimo, só volta a receber visita novamente após semanas, quando os galhos e folhas conseguem se regenerar em meia boca. Outro dia, e isso já fazem uns cinco ou seis anos, vi uma senhora com mais de noventa anos revoltada quando observou a falta de noção daquele que foi destinado a resolver o problema do excesso de galhos e folhas. “Filho da Peste!...”, gritou a senhora com o canto direito da boca espumando de raiva do tal sujeito. “E sua mão cai nada!”. Chega me arrepiei quando ouvi tamanho absurdo. Eu não sei se eu ria ou se ficava sério diante da cena. De cima, o podador sem entender entendendo, disse em voz tímida: “Se eu tivesse 30 anos menos eu mostrava a essa bruxa quem é o filho da peste!”. Nessa hora, vai passando um sujeito esquisito, metido a místico, e apruma uma previsão olhando para o sujeito:
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___ Cala a boca que a mulher é resadeira! Rezadeira forte!!
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Não sei se as palavras do tal rapaz incomodou o depenador de árvores ou se ele apenas quis descontar a raiva que absorveu da idosa revoltada, pois em seguida, desceu do tamborete que usava e o convidou para dizer aquilo a um metro dele, ameaçando arrancar-lhe a cabeça do pescoço...
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___ Pra que essa violência, Josué?!!
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Josué era o nome do valentão momentâneo.
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___ Vem cá que eu te mostro, catimboseiro dos infernos!!!
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Nessa hora, percebi o clima esquentando, e achando eu que não daria em nada a tal discussão, me aproximei dos dois esperando que a discussão cessasse, e percebi que o tal sujeito tremia de raiva não por causa da orientação do místico e conselheiro, mas por outro motivo qualquer que me fugia do senso. Do outro lado da praça, um pessoal observava o movimento, e sem querer ou querendo, gritaram de lá:
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___ Sai daí, maldiçoado!
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Não distingui se a falta de respeito fora direcionada para o funcionário, por está destruindo as árvores sem dá conta disso ou para o místico, metido a rezador e mais umas três dúzias de habilidades. Os dois olharam um para o outro após o coro direcionado a deles e se calaram. O silêncio reinou por alguns momentos. Afastei-me e em frente ao ultimo pé de amêndoa, sentei e refleti sobre a situação. Do nada caiu uma amêndoa rocha em cima do meu colo. Naquele momento uma parte da minha infância veio à tona. Lembrei-me que juntávamos amêndoas aos sacos. Fazíamos carreira para pegar aquelas que acabavam de cair. O leve impacto em cima da minha perna direita fez lembrar o dia em que uma amêndoa amarela caiu na cabeça de seu Zé Maria, um senhor bem coroa que trabalhava pelo comercio da cidade fazendo serviços grosseiros de todos os tipos. De recados a transporte manual de cargas de supermercados ele fazia. Gostava de jogar dominó com Tio Toinho, na casa em que ele morou na Avenida São Francisco. Sempre que ele passava de volta para ir dormir, não sei bem onde, parava lá em meu Tio e jogava umas partidas. O bom eram as prosas. Ouvi de tudo lá no primeiro cômodo da casa. Às vezes eu não entrava, e ficava observando o jogo e escutando as prosas pela janela. Tempo bom esse. Não se pode dizer que as lembranças ou as saudades devem ser descartáveis por nos emocionarem em algumas ocasiões. O que aprendi ao lembrar de tudo isso, é que o hoje não pode ser ontem, porém, só vivemos o presente porque o ponteiro do relógio, a página do calendário, as estações do ano sempre se vão. Cada um sabe o valor do tempo e daquilo que considera importante para sua vida. Eu iria falar sobre outras coisas nessa crônica, mas como as emoções e as lembranças são inesperadas e revisitadas sem esperarmos, acabei concluindo que se o hoje não é ontem, é preciso tocar o barco, caminhar, subir a ladeira e reconhecer que não se pode ser mais o mesmo quando tempo nos ensina a lhe dar com emoções e lembranças de acordo com nossa vida presente, que jamais poderá se pautar por retrovisor que trás pelo olhar os mesmos olhos, porém, com um olhar diferente, pois o hoje não pode(...), o hoje não é ontem...
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Fábio de Carvalho Maranhão, Cortês-Pernambuco.
Segunda-feira, 27 de maio de 2019 (16h29 – 17h06min) (Biblioteca Perticular / Escritório de Trabalho)


Fábio de Carvalho Maranhão
13 de março do 2019







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